Esqueça horário político eleitoral. Não
é por aí que você vai descobrir quem é cada uma daquelas figuras que
estão tentando chegar em Brasília ou na Assembléia de seu estado através
do seu voto. Ali você só vai ter uma noção de quem fala bem, tem boa
lábia e carisma. E isso conta Zero na hora de colocar a mão na massa.
"Não confie na TV. A TV é emoção, não é raciocínio. ? assim nos
telejornais, na novela e no horário eleitoral gratuito, que também usa truques de novela para emocionar o eleitor".
Tampouco leve tão a sério o Programa de Governo dos candidatos. "Programas de Governo do partido não são uma fonte boa para avaliá-los porque eles não são contratos
e, em geral, os políticos não têm o menor compromisso com eles.
Programa de Governo é um documento obrigatório pela Legislação
Eleitoral, e os partidos contratam profissionais para fazê-lo, junto com
um profissional de marketing, e só tem um objetivo: falar o que as pesquisas qualitativas apontam e vencer a eleição", alerta Negrão.
Há dois pontos básicos a serem avaliados: 1.
"Diga-me com quem andas que te direi quem és"; 2. Conheça o seu passado
e veja se ele já não tem nenhuma sujeira política, se tiver, caia fora,
pois porco nasce porco e morrerá porco. "O
principal no discurso de um político é verificar até que ponto aquilo
que ele diz é condizente com aquilo que ele fez quando estava em um
cargo público", explica o cientista político Cláudio Couto, professor do
departamento de Política da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo). Para saber do passado de um político, a melhor fonte é a
imprensa, sites de organizações que fiscalizam o trabalho dos políticos
(veja no link "Onde investigar"), os sites dos partidos e os do próprio
governo, que geralmente divulgam tudo sobre a vida dos parlamentares,
como o site da Câmara, do Senado, do TSE.
Prestar bem atenção em quem são as pessoas próximas ao candidato é essencial. Não só seus colegas de partido, mas seus amigos, investidores.
"No caso dos candidatos a presidente, tente adivinhar quem poderia
formar o ministério dele. Se você não tem a menor idéia, é porque você
não tem a menor idéia de quem seu cadidato é", diz Negrão.
Esses dois
quesitos valem para você avaliar tanto seu candidato à presidente,
deputado, senador ou governador. A partir daí, para cada um há quesitos
específicos. Em cada um dos casos, o primeiro passo é saber o papel de
cada uma dessas figuras nacionais.
Atitudes suspeitas
Todos os especialistas concordam: desconfie
sempre dos políticos que dão respostas simples a questões complexas, e
os que se colocam numa posição auto-suficiente, como se independessem
de partido. Se um candidato diz, por exemplo, que vai "acabar com a
fome", e não diz como, não dá para acreditar. Da mesma forma, se ele diz
que vai acabar com os impostos. "Sempre que um candidato diz que vai investir
numa área, a primeira pergunta a se fazer é: e vai tirar recursos de
onde?", diz o cientista político Rogério Schmidt, consultor da
Tendências Consultoria. Então, desconfie de propostas genéricas,
abstratas, que não especificam meios para serem implementadas.
Fique atento também a candidatos que tentam se desvincular de seu próprio passado, com um discurso do tipo "esqueçam o meu passado.
Todo mundo erra". E daqueles cujas credenciais democráticas não sejam
muito nítidas, ou seja: se mostram com um viés autoritário, sem muito
respeito por questões como liberdade de opinião, religiosa, direitos
individuais em geral.
Além disso, não
vá na conversa de quem fica o tempo todo apontando defeito em seus
opositores e acusando-os de "falta de vontade política". "Em política,
não basta querer. Fazer o eleitor acreditar nisso é vender ilusões",
alerta Couto.
Temas urgentes
Todos os candidatos vão falar de Educação, Saúde, Segurança. Mas, fazendo entre os especialistas um levantamento geral sobre os temas mais importantes no momento atual, dentro dessas áreas, chegamos a alguns consensos. Os candidatos deveriam estar preocupados principalmente com:
- Corrupção. Dentro
deste quesito, cada especialista apontou iniciativas cuja conseqüência
seria a melhoria do sistema no sentido de não dar mais brecha para a
corrupção. Couto, por exemplo, falou da profissionalização do Estado brasileiro.
"Hoje, cada vez que muda um governo, temos algo próximo a 17 mil cargos
que podem ser ocupados por indicações políticas, a despeito de qualquer
coisa. ? um número absurdo, que reflete o tipo de Estado que temos no
Brasil: patrimonialista, capturado por interesses privados. Se queremos
ter de fato um estado profissionalizado e eficiente, em que haja menos
corrupção, é fundamental que nos profissionalizemos e que todos os
cargos administrativos abaixo de Ministros, Secretários Executivos e
Assessores sejam ocupados por funcionários de carreira", opina.
Outra forma indireta de acabar com a corrupção seria o investindo na Educação básica, fundamental e média,
segundo Negrão. "O brasileiro tem um déficit de linguagem devido à má
condição escolar que, se ele tiver boas condições financeiras, pode
chegar até a fazer mestrado que continua com esse déficit. Até os
docentes têm dificuldades fortíssimas de linguagem. E quando é assim, a
pessoa não entende o discurso de um político, não consegue expressar o
que quer nem para si própria, e não consegue entender o que se quer
dele. Assim, não tem como cobrar", explica.
- Reforma da Previdência Social e da Legislação Trabalhista.
"Estes são temas obrigatórios para o próximo presidente", alerta
Schmidt. "O mundo hoje é cada vez mais integrado e os países competem
por investimentos. O Brasil tem crescido menos do que poderia. O ponto a
ser abordado pelos candidatos deve ser: o que pode ser feito para mudar
isso e assegurar a viabilidade do Brasil enquanto país competitivo na
Economia mundial? ? aí é que entra as reformas nas leis e na
constituição, para que os obstáculos sejam removidos", explica.
- Violência. Todos
os especialistas apontaram a questão da segurança como primordial. "?
urgente uma melhor organização das forças repressoras e uma melhor
integração entre as polícias federais e o judiciário. Quando as forças
são sectárias, isso facilita a corrupção dentro delas", diz Negrão.
Quando votar nulo, em branco, na legenda
Ao contrário do
que muita gente pensa, votar nulo não é a mesma coisa de votar em
branco. Por muito tempo, eles pareceram a mesma coisa porque, antes da
urna eletrônica, muita gente votava nulo por não saber como preencher a
cédula. Escreviam recadinhos para seus candidatos ou marcavam mais de um
candidato. E o voto acabava sendo anulado, sem o eleitor querer.
Agora, o nulo e
o branco voltaram a ter os seus respectivos papéis originais. O voto em
branco é o voto da apatia. Quem vota em branco está dizendo: "eu não
estou nem aí para estas eleições. Não gosto de política, sou alienado.
Escolham por mim". Já o voto nulo é uma forma de protesto. Você está
dizendo: "não gosto destes candidatos, não me sinto representado por
nenhum deles".
Não só o
significado de cada um é diferente, bem como o efeito. Existe, sim, a
possibilidade do voto nulo resultar no cancelamento das eleições.
Segundo o artigo 224 do Código Eleitoral que diz que "se a nulidade
atingir a mais de metade dos votos do país nas eleições presidenciais,
do estado nas eleições federais e estaduais, ou do município nas
eleições municipais, julgar-se-ão prejudicadas as demais votações, e o
Tribunal marcará dia para nova eleição dentro do prazo de 20 (vinte) a
40 (quarenta) dias". Apesar da Constituição Federal, no artigo. 77,
definir que votos nulos e brancos não são computados - contrapondo-se
assim à determinação do Código Eleitoral -, vai depender da decisão de
um juiz se as eleições seriam válidas, segundo o TRE.
O problema, no
entanto, é que as novas eleições seriam feitas com os mesmos candidatos,
o que acaba não fazendo sentido. "Além disso, as novas eleições
acarretariam um rombo nos cofres públicos, uma vez que custaria ao país
R$ 20 bilhões", explica o juiz do TRE-SP (Tribunal Regional de São
Paulo) José Joaquim dos Santos.
Para
alguns especialistas, o voto nulo é tido como um retrocesso
democrático. "Quem vota nulo está dizendo 'me comandem, porque eu não
sei dirigir, vou sentar no banco
de trás. Voto nulo é tiro no pé", diz Negrão. O cientista político
Charles Pessanha, da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro)
também é contra votar nulo. "Na época da ditadura, poderia até fazer
sentido. Mas agora você tem todo o direito de votar num candidato e, se
ele não for bom, você pode trocar o candidato nas próximas eleições.
Todas as pessoas têm direito à representação. Todas as tendências têm
direito à representação. Então, tudo quanto é grupo foi trazido para
dentro do sistema político. A oferta de candidatos é muito grande. Não
faz sentido votar nulo", diz. Jairo Nicolau, cientista político do
Iuperj (Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro), também
contesta o nulo: Não é possível que, entre os milhares de candidatos que
existem, não se encontre algum que possa ser digno de voto".
A Campanha da
MTV "Ovos e Tomates" foi confundida por alguns como uma ode ao voto
nulo. Mas, segundo Zico Góes, diretor de programação da emissora e um
dos autores da campanha, foram mal interpretados. "Somos contra o
político nulo e contra o eleitor nulo", argumenta. Ele descreve o
político nulo como aquele que não tem compromisso com a legalidade. E o
eleitor nulo é quem não tem interesse pela política, tolera as
ilegalidades que acontecem como se fosse normal. ? também quem se deixa
enganar ou vota de acordo com interesses pessoais. "Somos a favor do
voto indignado", conclui.
Além do nulo e do branco, você pode ser daqueles que não vota em
pessoas, mas em ideologias. Neste caso, a sua praia é o voto de legenda,
ou seja: o voto no partido. Quando você vota na legenda, seus votos vão
para os deputados mais votados do partido, que são os que têm mais
chances de irem para o Congresso. O efeito disso é ajudar a eleger uma
bancada maior no Congresso. A vantagem de votar na legenda é que, no
Legislativo, quanto mais quorum tiver um partido, mais peso ele terá nas
decisões, aprovações ou veto de leis. "Em 80% das vezes, os
parlamentares seguem de maneira disciplinada a orientação de seus
partidos", diz Couto. Este tipo de voto, segundo Schmidt, está
crescendo, apesar da nossa cultura ser muito personalista. "O povo acha
que o presidente faz tudo sozinho, basta ter vontade política. E não
basta", afirma Schmidt.
Apesar de
muitos acreditarem que atualmente os partidos são todos iguais e que não
existe mais ideologia, muitos cientistas políticos contestam este
pensamento. "Os partidos têm, sim, diferenças, nuances. Principalmente
na maneira de se comportar no Legislativo", explica Couto. Segundo ele,
as políticas econômicas geralmente são semelhantes porque as
alternativas factíveis não são tantas. Mas eles se diferenciam em
Educação, nas políticas sociais, na Saúde, no modo como conduzem a
Política Externa, os procedimentos administrativos, a relação entre
Estado e sociedade. "Alguns enfatizam mais a participação, outros
acreditam que a melhoria de mecanismos de representação é mais
proveitosa", diz Couto.
Apesar desta
vantagem, os especialistas concordam que hoje, os partidos têm pouca
influência sob as decisões do presidente eleito. "No Brasil, o
presidente tem muita força, e toma decisões independentemente do
partido, que é apenas uma de suas fontes de consulta", explica Negrão. ?
por isso que a maioria dos candidatos à presidência busca fazer aliança
com outros partidos, quanto mais alianças, mais ele terá força para
aprovar suas medidas no Congresso.
Todas
as orientações acima são válidas para você começar agora a avaliar os
candidatos. Mas, na verdade, o ideal seria que a sua pesquisa sobre a
vida deles já tivesse começado há mais tempo, não só na boca das
eleições. E que não fosse meramente uma pesquisa, mas uma interação
contínua com a política. "A gente tem que assumir o governo como sendo
nosso e não usar só o voto como expressão política. O voto é apenas uma
das expressões políticas possíveis. Nós deveríamos ter ações políticas
cotidianas: reclamar em relação aos serviços públicos, se filiar a ONGs,
fazer trabalho voluntário, defender nossos direitos de consumidor, acompanhar pela imprensa e pela internet a atuação dos políticos, entrar em contato
com eles, cobrar", diz Daniel Cara, vice-presidente do Conselho
Nacional de Juventude (Conjuve), órgão da Secretaria-Geral da
Presidência da República.
Isso porque,
acompanhando a vida dos políticos por um bom tempo, lendo a respeito, é
que você vai ter subsídios para saber se o discurso que ele faz hoje no
debate na televisão ou o que ele declara à imprensa condiz com a atuação
dele no passado.
Ou seja: mais
do que informação, o ideal é que você tenha formação política. Para
isso, é essencial ter uma boa educação. "A falta de informação e de uma
boa base escolar da população deixa as lideranças de todas as instâncias
à vontade para fazer o que quiserem", diz Negrão.
Por Bárbara Semerene
Fonte: http://www.blogcabofernando.com/2013/10/conscientizacao-politica-nao-confie-nas.html